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domingo, 15 de janeiro de 2012

poema do absurdo circunstancialismo humano ( Rogério Nunes)







Morri...
Os meus olhos perderam a luz,
O brilho,
O sonho,
A vida...
Num caminho sem futuro, nem regresso.
Da erva fresca onde descansei,
Restam hoje ervas daninhas.
Todas as flores que toquei, murcharam.
E o relógio da torre da igreja, lá continua na soma do tempo.
A cascata de água cristalina onde me banhei,
É agora uma torrente de lama,
Os pássaros pararam de cantar.
E o relógio da torre lá continua imparável...
Das mulheres que amei,
Restam pedaços de dor,
Sinfonias de corpos feridos,
Sem rumo nem destino.
E o relógio da torre continua impassível.
Morri...
Abençoada Providência, que ainda castiga os pecadores.
Subi ao cadafalso, no meio de uma multidão ululante de raiva,
De mim levaram apenas o silêncio...
Num último desejo, pensei...
Morram os ABENÇOADOS.
E os sinos tocam a compasso,
Marcando o fim de um tempo.
De três tempos,
Três notas,
Três sons,
Três letras,
Três suspiros,
Três angustias,
Três esgares,
Três enganos,
Três equívocos...
Uma mulher,
Uma sinfonia,
Uma sonata,
Um acorde,
Um despertar,
Um sorriso,
Um sonho.
Um mundo, tão grande como a minha janela,
De onde diviso o nevoeiro em que me perdi,
O mar onde me afoguei,
O pequeno barco que me levou ao mar alto,
Onde tudo é tão salgado como lágrimas,
Que marcaram este pedaço de pedra inerte,
Que a erosão corroeu, e o tempo desfez,
Resta apenas areia,
Onde ainda uma criança poderá brincar,
E desse modo entrar neste falecido,
Como oferta Divina de nunca ter sabido ser criança.
O relógio da torre parou,
O meu tempo acabou...
Nem os finados ouvi,
A minha alma perdeu-se,
Nem Deus nem o Diabo a encontrarão,
Até eles próprios a repudiam.


de Rogério Nunes

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